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"Tenho em mim todos os sonhos do mundo"

Desde domingo que ando a pensar neste post e em como escrevê-lo. Talvez por ser um tema que mexe com o mais profundo de mim, tenho andado a adiá-lo. Pensei em abordá-lo de diferentes maneiras mas não cheguei a nenhuma conclusão por isso resolvi, de mente aberta, começar a escrever e deixar os pensamentos fluírem.


Pouco tempo antes da lua de mel recebi, no meu local de trabalho, um caderno em branco, com uma imagem do Fernando Pessoa na capa e a frase "Tenho em mim todos os sonhos do mundo". Não sou grande fã de FP mas naquele momento adorei a ideia. Decidi automaticamente que seria o meu caderno de viagens. Comecei por escrever como título na primeira página a viagem e as datas, as horas dos voos e deixei espaço para as noites. De seguida imprimi mapas dos sítios para onde ia e colei nas páginas do caderno. Escrevi todas as dicas e informações úteis que encontrei acerca dos sítios onde ia. Tornou-se o meu primeiro guia pessoal. Mais tarde tornou-se também o meu diário de viagem. Ocupei cerca de um terço do caderno. Tenho em mim o sonho de que esta seja só a primeira viagem deste caderno. Tenho em mim o sonho de que este seja só o primeiro de muitos cadernos.


Este fim de semana voltei a ouvir esta frase num contexto totalmente diferente mas que me marcou profundamente. Foi dita numa apresentação de um livro ao menino que o escreveu, com o acréscimo de "parabéns por lutares por eles!" Dei apoio este menino durante 4 anos. Quando o conheci estava ele no 6º ano e acompanhei o seu crescimento até ao final do 9º ano. Um menino muito especial cheio de sonhos, sonhos simples como ter amigos, ir a um concerto, continuar a estudar. Sonhos que apesar de parecerem simples, eram muito complicados. Sonhos condicionados por quem vê apenas uma cadeira de rodas, a dificuldade motora, a dificuldade na fala. Por quem não consegue ver que, para lá de tudo isso, há um menino igual aos outros, que só quer, na verdade, ter as mesmas oportunidades que as outras pessoas e, acima de tudo, ser feliz. Mas todos nós somos condicionados por aqueles elementos: a cadeira e as dificuldades! Quando ele, no fim do 9º ano, me disse que tinha começado a escrever um livro, apoiado a 100% pela mãe, o meu pensamento foi imediato: pobre miúdo, vai apanhar a desilusão da vida dele. Dois anos depois tenho de dar a mão (e o corpo todo) à palmatória. O livro dele foi publicado! A verdadeira desilusão da vida dele foi chegar ao 10º ano e descobrir que não podia continuar a estudar porque o método escolhido para ele não lhe dava equivalência aos anos escolares. E foi esta desilusão que lhe deu ainda mais força para lutar pelos seus sonhos. Lutou, lutou e conseguiu. Além de ter publicado o livro conseguiu algo que raramente é conseguido, retiraram-lhe o currículo específico individual e, em Setembro, ele iniciará o 5º ano. Assim que soube disto, o meu pensamento foi imediato, novamente: não sei se ele terá capacidade para fazer um percurso escolar dito normal! E logo de seguida tive vontade de bater em mim própria. Porque raio é que o meu primeiro pensamento é sempre de dúvida e descrença?! Este miúdo já conseguiu tanto, tanto que ninguém esperava que conseguisse. Já deu mais que provas que é um lutador e que não pára de lutar enquanto não conseguir o que quer. Quem sou eu, que me deixo andar neste equilíbrio de bem estar forçado para opinar ou duvidar das capacidades deste miúdo?! Malditas expectativas, malditas condicionantes.


E tudo isto me fez pensar em mim. Tenho tantos sonhos em mim e não tenho lutado por eles. Não me sinto feliz com a minha vida mas, na verdade, não faço nada para a alterar. Penso sempre que um dia vou conseguir, um dia vou lutar pelos meus sonhos, um dia, não já porque agora não dá. Há sempre alguma coisa que me impede de lutar por aquilo que me faz feliz. Quando pensei inicialmente neste post, pensei em fazer uma lista dos meus sonhos. Mas apenas dos sonhos, não de objectivos porque acredito que quando definimos um objectivo temos de lhe associar um prazo e por agora não quero comprometer-me com prazos. Neste momento esta parece-me a ideia mais absurda do mundo. Fazer uma lista de objectivos mas chamar-lhes sonhos para não me sentir obrigada a lutar por eles, a torná-los realidade. Tudo em nome das expectativas e da estabilidade. Na verdade, neste momento ainda não sei bem por onde começar e acho que é isso que faz continuar neste estado de torpor, neste estado de existir simplesmente e continuar o dia a dia à espera de um dia destes tropeçar nas minhas respostas.


Mas para já estou a tentar cumprir um sonho: ter todos os dias algo que me faça feliz. Sei que não é possível ser feliz todos os momentos da nossa vida, mas para que isto conte, para que a nossa existência valha a pena, temos de ser felizes pelo menos uma boa parte do tempo. Temos de conseguir que todos os dias haja pelo menos uma coisa positiva e ser isso o que pensamos antes de adormecer. Pelo menos este sonho está a ser cumprido. Os outros vou ter de trabalhar mais...


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